segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

No clube da luta


Este poderia ser mais um post sobre festas de fim de ano e sobre as costumeiras reflexões existenciais que sempre fazemos durante a passagem de mais 365 dias, porém esse tema já está mais do que usado em nossos 2000 e poucos anos de celebrações. Este (post) também poderia ser mais uma crítica de cinema, mas também não se encaixa exatamente no perfil, então tentarei aqui, unir esses dois temas (por mais bizarro que pareça) para celebrar mais um final de ano em nossas vidinhas queridas.
Faz alguns dias, vi um filme que há muito tempo vinha me sendo uma incógnita, e por causa disso, sempre tive receio de assisti-lo. O Clube da Luta. Muitos o recomendaram, alguns o apedrejaram. Mas sei lá, nessas últimas semanas do ano, ele me caiu em um bom momento, visto que minha mente estava completamente em branco. Eu precisava de alguma coisa que me tirasse da situação em que estava, apesar de aparentemente não me ser incômoda. Precisava de um soco no estômago, precisava de um despertador soando alto em meus ouvidos. E foi isso o que senti após assistir o filme.
O Clube da Luta foi dirigido pelo David Fincher e teve como roteirista Jim Uhls, porém é baseado no livro de Chuck Palahniuk, um escritor americano que vem sendo cultuado na atual leva de escritores da literatura underground norte-americana. Então, a história tem como ponto central um investigador de seguros (Edward Norton), sem nome, que sofre de insônia e cansaço por causa de suas inúmeras viagens. Certa vez, em um de seus vôos, conhece Tyler Durden (Brad Pitt), um cara que é tudo que o investigador não é: divertido, vivaz, aventureiro, bacana, corajoso, etc. Após uma inesperada explosão em seu apartamento, vai morar com seu novo amigo, e juntos acabam fundando um clube de luta, onde os homens põe suas insatisfações pra fora brigando entre si. Em pouco tempo esse clube acaba crescendo e ganhando incontáveis adeptos, e assim, fugindo do controle de seu criador.
Há muitas coisas que se pode tirar dessa película para comentar, tanto análises técnicas quanto literárias. Mas o que quero comentar aqui é um determinado ponto, que talvez seja um dos mais importantes, pois é uma das principais razões que faz parte dos argumentos de quem o rejeita. Muitos dizem que é, e realmente é, um filme violento. Mas não violento, muuuuito violento. Cru. Li uma crítica uma vez que dizia que Clube da Luta não passava de um filme sonolento com caras se quebrando. Um grande equívoco.
Algo que deve ser salientado é que o objetivo do clube não é bater, e sim apanhar. Toda a violência que se passa na obra não passa de uma metáfora, as lutas seriam um artifício das personagens para provar para si mesmas que ainda possuem sangue em suas veias. O objetivo do clube é justamente poder sentir algo, sentir-se vivo, criar cicatrizes. Ao apanhar, a personagem principal, descobre que aquilo que julgava essencial não era primordial em sua vida. Descobriu que vivia pelo consumismo, pela futilidade. Que era um produto da massa (por isso não possuir um nome?). Tyler deixa muito claro essa idéia ao afirmar que “As coisas que você possui acabam possuindo você”. As personagens cansaram disso, cansaram de serem unidades de um todo. Elas querem sentir “que não são apenas “o dinheiro que têm no banco ou as roupas que vestem”, mas seres humanos de verdade. O objetivo de Tyler é esse acordar. É preciso aceitar a dor, e não sempre tentar evitá-la. Em outras palavras, aceitar a vida, com todas as suas dificuldades, e não ter medo de encará-la de frente.”
Agora o que vou dizer aqui é super piegas e contraditório, visto o que tento “criticar” no meu primeiro parágrafo. O que quero saber é por que ao invés de apagar todos os erros, burradas e desilusões desse ano que passou (e de todos os outros) não os guardamos dentro de nós? Por que não tatuamos todos eles em nossa pele como uma cicatriz? Por que devemos apagar todo o passado para tentar seguir em frente com um novo começo? Pra mim essa história de um “novo começar”, um “novo caminho”, já não existe mais. Pra mim agora o que existe é uma continuação, uma evolução do ser humano. Assim como no Clube da Luta, precisamos chegar no fundo do poço, na pior situação possível para termos certeza do que somos, do que podemos chegar a ser.
Por que cantar “adeus ano velho, feliz ano novo” se tudo o que nos faz são os anos velhos em que vivemos? Por fim, para continuar na sessão “fim de ano”, digo que não importa se as pessoas consomem mais do que rezam em volta do presépio, não importa também o tamanho do chester ou da champagne que consumiremos no Reveillon. Importa muito mais pensar que nada foi em vão. Que todos os clubes de luta que participamos nos deixaram incrivelmente destruídos. E que ficaremos ainda mais depois dos diversos “duelos” que ainda temos pela frente. E pra terminar mais clichê que o tema desse post:

Valeu a pena? Tudo vale a pena

Se a alma não é pequena.

Quem quer passar além do Bojador

Tem que passar além da dor.

Deus ao mar o perigo e o abismo deu,

Mas nele é que espelhou o céu.

(Mar Português, Fernando Pessoa)


quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

So Yesterday

Olho no espelho, não vejo a mesma pessoa! Sim vejo, mas com algumas modificações... Não quero que fique tarde demais para mim, como já ficou para muitos! Não quero cair na loucura, na insanidade, na rivalidade própria, na pretensão de não querer ser feliz!
Penso agora em coisas que combinem comigo. Penso no Sol, que agora é meu maior companheiro, apesar de sempre continuar preferindo a luz do luar! Adoro esse sorriso bobo que dou na frente do espelho. Admiro meus olhos verdes brilhando, depois de um curtíssimo tempo derramando lágrimas... Essas que serviram como colírio para mim, pois no fim tudo sempre vale a pena e tem um valor!
Adoro essas linhas tortas que escrevo agora, sem maiores reflexões sobre o mundo, as dores, ou a eterna questão do “ser/estar” no mundo. Escrevo agora, pois me olho e vejo que não é tarde demais para mim, então escrevo sobre sorrisos e busco estrelas no céu!
“ I'm just a bird thats already flown away.”

domingo, 6 de dezembro de 2009

Observar e Avançar

Eu caminhava olhando para o chão, não conseguia observar com nitidez o que havia na minha frente. Notava apenas que o dia estava nublado, percebia isso pela falta de raios solares batendo em meu rosto. O meu caminhar continuava, em passos curtos de uma pressa rápida. O chão era o que eu observava nesse meu trilhar. Ele era sujo, em cinza escuro, uma cor ríspida, feia. Em alguns momentos tentei erguer meu pescoço e encarar um pouco a multidão que passava, mas os rostos me pareciam doloridos demais. Com esse rumo eu já sabia onde ia chegar, mas preferia não saber.

Continuei na perambulação, até que tive uma súbita coragem e olhei pra frente. Observei árvores florindo, flores brotando, típico da primavera. Mas em meus pensamentos estávamos no frio inverno. A brisa começou a encostar no meu rosto...Ah! Que bela sensação, a quanto tempo não a sentia. Os carros passavam ao meu lado num vai e vem sem parar. Eles eram de todas as cores: brancos, pratas, pretos, verdes, azuis, amarelos, cinzas, vermelhos...vermelho de amor, de coração pulsando, de sangue correndo nas veias...era o que eu queria sentir novamente!

Apesar de toda a dor que estava sentindo meu pescoço continuou erguido e na minha frente vejo uma bela senhorita. Cabelos loiros, pele branca, olhos castanhos, linda. A quanto tempo não via uma mulher bonita como essa, ou melhor, a quanto tempo não via uma mulher. Veio de dentro, do meu âmago, um desejo de tê-la em meus braços, de sentir a pele dos seus lábios. Sua boca era linda, bem esculpida, até cheguei a pensar que ela havia sido moldada por alguém. Talvez ela seja uma escultura que passou a viver, ou um quadro em que foi soprado o fôlego de vida. Mas ela passou, já está pra trás e não consegui virar meu pescoço para chamá-la.

Então minha caminhada continua sozinha, e meu pescoço cansa, volto a olhar para meus pés. Uso um all star preto, meio encardido, mas é o meu preferido. Agora o chão parece mais limpo, mais claro, ou será minha vista que está mais nítida? De repente vejo um all star verde ao lado do meu tênis escuro, olho para o lado e recebo um sorriso, parece que encontrei alguém para caminhar ao meu lado. O rapaz diz para mim: “Também está observando os carros, as pessoas, as árvores e as flores?” Eu respondo: “Sim!”. E ele passa a me acompanhar. Uma grande amizade surge, e começamos a observar mais coisas juntos, começo a olhar mais para as pessoas e sorrir para elas. Comecei a notar que o sol começava a deixar seus raios chegarem em meu rosto, e eu o respondia com um grande sorriso. Olhei para o lado e ele disse para mim: “O verão está chegando e nossa viagem continua!”

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Viagem

Eis a minh'alma, as asas palpitando

Como a saudade de agitado lenço

O segredo dos longes procurando...”

(Cruz e Souza, Asas Abertas)


Ontem li, como de costume, trechos de alguns textos antes de ir dormir. Gosto de alguém me contando algo, ensinando algo, ou apenas expressando algo, para que assim, eu possa esquecer meus problemas habituais e velejar descansadamente no meu sono apressado.

Quando não leio nada, acabo tendo infinitas discussões dentro de mim ao deitar minha cabeça no travesseiro. Já quando leio, não sei, mas tenho a impressão de sempre ter uma conversa franca, um desabafo que me extrai todo peso de um dia (não?) cumprido.

Bom, tendo liberado todas as minhas energias, pousei minha cabeça no lençol frio de minha cama. De olhos fechados, escutando apenas o silêncio de meu quarto, lembrei de como era bom não ouvir absolutamente nada. Quero dizer, quando jovem, costumava ir à praia sozinha. Apenas eu e meus pensamentos. Mas, quando eu pisava naquela areia úmida, nem eles ousavam soltar um gemido sequer.

A palavra praia nunca me agradou. Sempre me remeteu à um dia de domingo. À um sol de rachar e cem pessoas, no mínimo, tentando ocupar um mesmo espaço. Espaço este “projetado” somente para 60 pessoas. Bom, creio que meu lado misantropo sempre foi avesso à esse tipo de situação. Mas houve um dia. Sempre há um dia.

Logo depois de me mudar, a minha primeira vez, descobri algo que me fascina até hoje. Nunca tinha sequer imaginado que a praia seria, um dia, um refúgio para minha alma fugitiva.

Era final de tarde. Havia pequenos resquícios de sol no céu azul-acizentado. Não falei com ninguém, não queria falar. Apenas peguei uma garrafa d'água e meus olhos perguntaram para meu gato se queria me acompanhar. Este apenas me olhou com fadiga e voltou a fazer o que mais sabia. Dormir.

Comecei a andar. Minhas pernas não tinham rumo, mas minha cabeça sabia muito bem aonde queria ir. Ficava pensando em quantas pessoas já fizeram esse mesmo caminho antes de mim. Quantas pessoas já andaram por essa mesma rua de areia vermelha, com pedregulhos irritantes. Até hoje meus pés praguejam aquelas pedras. Porém meus olhos agradecem, por nunca terem esquecido aquele verde que fotografavam enquanto caminhavam naquela rua.

Enquanto andava, percebia a mudança e a troca de ambientes. Primeiro casas, mato, pássaros, canto, areia, asfalto, postes, pessoas. Ao sair da minha rua, sempre dava de cara com um boteco. O cheiro do álcool e os gritos faziam meu estômago girar. Tinha também o restaurante/mercearia ao lado. A senhora que ficava naquele caixa sempre me assustou profundamente, apesar do sorriso sincero de simpatia.

Atravessei a rua e olhei de esguelha para uma enorme casa cor de abóbora. Lá moravam umas 13 ou 15 pessoas. E não eram da mesma família. Nunca entendi como aquilo funcionava, mas sempre quando passava pela frente daquela casa, ouvia os berros de uma mulher. Acho que era a dona da casa. Ou alguém sempre a atormentava, ou ela apenas gostava de falar alto. Meu estômago girava mais uma vez. Sempre agradeci por não morar naquele lugar.

Passando por muitas outras residências e vozes, cheguei no começo. Avistei uma pequena capela, e alguns bancos brancos em sua frente. Lá, estava um senhor sentado, rodeado por algumas mulheres e crianças. Ele falava, mas ninguém parecia se importar. Quando me aproximei, ele me olhou e apontou para um alto pilar de madeira à nossa frente.

Esse pau foi erguido faz mais de 50 anos. Quando eu chegava perto dele, me sentia como uma formiga. Sorri para ele, porém não entendi o que disse depois. Apenas concordei. As pessoas que o acompanhavam me olhavam incrédulas. Não entendi o porquê. Me despedi daquele senhor com um tapinha em seu ombro. Nem olhei para os outros. Não me simpatizei com nenhum.

Seguindo meu caminho, avistei um cemitério. Mas decididamente aquele lugar não me parecia um cemitério, pelo menos a idéia. Havia árvores ao seu redor. Árvores, mato. Já conseguia sentir o cheiro do mar. Decidi que quero que me plantem aqui no futuro.

Andei por mais uns 10 minutos numa estreita estradinha de terra, e como o esperado, já não ouvia mais nada. Nem o som dos carros, em a voz do senhor da capela, nem as crianças brincando, nem os berros da mulher da casa grande. Finalmente cheguei àquela areia branca. Nesse horário ela estava muito mais fina e branca que o de costume. Tirei meus tênis e comecei a caminhar lentamente.

Não havia ninguém lá. Fui até a água e molhei meus pés transparentes. Nunca gostei tanto de um lugar como daquele. Respirei, o cheiro e o estranho vazio que senti dentro de mim me agradavam explendidamente.

Procurei um lugar para repousar. Deitei-me logo, visto que não precisei perder muito tempo com minha busca. De olhos fechados, tentei ouvir alguma coisa, mas só conseguia ouvir o barulho das ondas chegando de leve, à praia.

Pensei no quando somos simples enquanto sozinhos. O quanto somos puros. Pensei no quanto somos verdadeiros diante da solidão. Palavra esta que sempre me causou temor. Mas com o passar do tempo acho que esse é um dos momentos em que mais vivi.

A praia, a areia, o mar, o cheiro, a solidão e o silêncio. O silêncio! Uma vez li que o silêncio murmura palavras perturbantes como um afago. Suspirei.

Mon silence est ma force! No meu quarto, olhava para o teto. Plano, cor do creme hidratante da minha mãe. Mas o que vi lá não era nem meu quarto, nem o creme. Mas sim o céu daquela noite em que estavam eu e meu silêncio. Não vi, senti. Pela primeira vez saciei minha sede. Infinito.